última atualização 09-01-2023

Dicionário da Educação Audiovisual - Ideologia

 

Marise Ramos

Possui graduação em Licenciatura em Química pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (1990), mestrado em Educação pela Universidade Federal Fluminense (1995) e doutorado em Educação pela Universidade Federal Fluminense (2001). Pós-doutorado em Etnossociologia do Conhecimento Profissional na Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro/Portugal (2012). 

 

Tomamos de Konder (2002) o reconhecimento sobre a antiguidade do tema da ideologia, entendida, inicialmente, como pressões deformadoras que atuam sobre a elaboração do conhecimento. Daí a pertinência de se tratá-lo em confronto com o tema da ciência, de um lado, e da cultura, de outro. No primeiro caso, o desprendimento das explicações religiosas sobre o mundo e o ser humano é fundamental, fato devido, pioneiramente, aos gregos, mas que mobilizou pensadores desde o renascimento, passando pelos iluministas, até os intelectuais contemporâneos. Mesmo quando que o tema da ideologia ainda não aparecia explicitamente, o confronto entre a “falsidade” e a “veracidade” ou universalidade do conhecimento – o quanto as elaborações abstratas, as teorias que visavam explicar o real correspondiam de fato ao que se buscava explicar – é uma questão importante desde que o próprio ser humano conferiu a si a necessidade e o direito de apreender a realidade por sua própria razão. Assim, a ascensão de um tipo de conhecimento considerado verdadeiro e universal erigiu a ciência, acompanhada de critérios que atestariam tal validade. Trata-se de um problema da epistemologia, como recorte específico da filosofia que se preocupa com a questão. Ao mesmo tempo, foi preciso considerar que a cultura de um grupo social impõe influências e restrições aos modos de conhecer. Esses foram problemas cruciais que os iluministas buscaram enfrentar com a confiança e o otimismo da razão.

Foi com essa inspiração que Destutt de Tracy, um filósofo francês, publicou o livro “Elementos de ideologia”, em 1801. Para ele, a ideologia seria uma nova disciplina filosófica para a qual o conhecimento chega às pessoas por meio de suas experiências e sensações, sendo necessário “decompor” essas sensações em ideias, a fim de superar o subjetivismo produto desse “aglomerado” de impressões e se chegar ao conhecimento mais fidedigno do real. Mas já nesse contexto, a palavra “ideologia” e o adjetivo “ideólogos” começa a adquirir uma conotação negativa. Isto devido a um conflito com Napoleão Bonaparte, em 1812, que reagiu à pretensão desses filósofos de ensiná-lo a governar. O imperador designou Destutt de Tracy e seus grupo como “ideólogos”, ou seja, “metafísicos, que fazem abstração da realidade, que vivem em um mundo especulativo”. (LOWY, 1993, p. 11)

Essa acepção persistiu em escritos do socialista utópico Charles Fourier, datados principalmente de 1808 a 1836, que levaram inspiração a Karl Marx e Friedrich Hegel, filósofos do socialismo científico, manifestada, por exemplo, no Manifesto Comunista (1848). (PETITFILS, 1977, p. 91)

Porém, é no diálogo crítico com a filosofia alemã que eles elaboram seu conceito de ideologia. Um aspecto importante foi a revalorização do sujeito realizada pelo idealismo clássico, na passagem do século XVIII para o XIX (BOTTOMORE, 1988; KONDER, 2022), desde Kant até Hegel. Para Kant, afastando-se do empirismo, todo conhecimento era, inevitavelmente, uma construção subjetiva; e a superação do “subjetivismo arbitrário” implicaria o uso da razão pelo sujeito, “empenhando-se em compreender-se tal como era, tão objetivamente quanto lhe fosse possível”. (KONDER, 2002, p. 26) Mesmo assim, a singularidade ou particularidade do sujeito que quer conhecer sempre seria um obstáculo estrutural à elevação da consciência à universalidade do conhecimento.

Hegel propôs resolver este problema pela mediação histórica e dialética: se a verdade só pode ser alcançada pela universalidade ou totalidade, esta “é sempre resultado de um processo de totalização, tanto no plano do conhecimento como no plano da realidade, quer dizer no plano da ação histórica dos homens”. (id. ibid., p. 27) Marx se entusiasmou com a perspectiva realista da sociedade civil presente no pensamento hegeliano; mas discordou frontalmente do ideal do “Estado ético” como a expressão da universalidade; além disso, inverteu sua dialética – não é a consciência que transforma o real; mas é o real, produção material da ação humana, que transforma a consciência. Como explica Enderle (2005, p. 13), “ao hegelianismo da posição marxiana incorpora-se o sentido ativo, prático-crítico, da filosofia de Kant”. Essa síntese ele apresenta em 1842, na Gazeta Renana, aprimorada em 1843 na Crítica da filosofia do direito de Hegel.

Lowy (1993), explica que o termo ideologia, com o sentido originalmente elaborado por Destutt de Tracy e depois modificado por Napoleão, adquire a conotação de “consciência invertida” na obra A Ideologia Alemã (1946), de Marx e Engels. Isto se passa justamente quando os filósofos elaboram o princípio do materialismo em oposição ao idealismo: “não é a consciência que determina a vida, mas a vida que determina a consciência”. (MARX e ENGELS, 1991, p. 37) Trata-se de uma síntese sobre o fato de que homens e mulheres, ao desenvolverem sua produção material e o intercâmbio material com a natureza transformam não só a realidade, mas também o seu pensar e o produto de seu pensar.

Por isto, a ideologia também é produto de uma forma de viver: “se, em toda a ideologia, os homens e suas relações aparecem investidos como numa câmara escura, tal fenômeno decorre de seu processo histórico de vida, do mesmo modo por que a inversão dos objetos na retina decorre de seu processo de vida diretamente físico”. (p. 37) O princípio da naturalidade da propriedade privada, provoca uma inversão no campo das ideias que é resultante da inversão das relações sociais de produção, qual seja, o fato de a classe produtora – os trabalhadores – ser expropriada e explorada pela classe proprietária, a burguesia, que se torna dominante. Assim, “as ideias da classe dominante são, em cada época, as ideias dominantes (...) que nada mais são do que a expressão ideal das relações materiais dominantes, as relações materiais dominantes concebidas como ideias; portanto, a expressão das relações que tornam uma classe a classe dominante; portanto, as ideias de sua dominação” (p. 72)  

Posteriormente, na Contribuição à crítica da economia política, Prefácio (1859), Marx enuncia a conhecida “metáfora do edifício” para explicar que “o conjunto das relações sociais de produção constitui a estrutura econômica da sociedade, a base concreta sobre a qual se eleva uma superestrutura jurídica e política e à qual correspondem determinadas formas de consciência social”. (MARX, 2003, p. 5) Na esfera da superestrutura, além das formas jurídicas e políticas (as quais constituem uma dimensão específica do Estado no sentido estrito), o filósofo acrescentará também as formas religiosas, artísticas e filosóficas, reconhecendo-as como “as formas ideológicas pelas quais os homens tomam consciência desse conflito” (as contradições entre o avanço das forças produtivas e a manutenção das relações de produção baseadas na propriedade privada).

Neste momento, ao referir-se à revolução social – momento em que a transformação da base econômica altera a superestrutura – as formas ideológicas também se alteram, na perspectiva de não representar a “consciência invertida”, mas sim a consciência histórica advinda da superação da propriedade privada (superação, portanto, da naturalização desse princípio) e da dominação da classe trabalhadora pela classe proprietária. Parece-nos, então, que o conceito de ideologia em Marx e Engels começa a se alargar para além de uma condição absoluta de consciência invertida, já que a classe dominada, na medida em que toma consciência das contradições materiais entre o avanço das forças produtivas e a manutenção das relações sociais de produção, pode se constituir como classe revolucionária e, assim, elaborar e difundir sua própria visão de mundo, sua própria ideologia.

Para Lowy (1987) é na obra O Dezoito Brumário de Luís Bonaparte (1852), que se encontraria essa “definição marxista mais precisa, mais concreta e mais fértil das ideologias e das visões de mundo enquanto expressão de uma classe social determinada (o conceito utilizado por Marx é o de ‘superestrutura’)”, (p. 96) e o papel dos “representantes políticos e literários” das classes, que sistematizariam essas visões de mundo.

Tais elaborações são feitas pelo autor mediante uma interpretação sobre o fato de as condições históricas limitarem a visão de mundo de uma classe e de seus intelectuais representantes. Com isso, a distorção ideológica não se reduziria à simples racionalização cínica e grosseira orientada pelos interesses mesquinhos de uma classe ou grupo social. “Em situações decisivas, os indivíduos agem sem intenção criminosa, sem dolo, ao adotar um modo de pensar ideologicamente distorcido”, explica Konder (2002, p. 43), sobre a posição de Marx naqueles escritos. Nas palavras de nosso filósofo brasileiro, com isto, Marx argumentava que os representantes políticos de uma classe podem alcançar níveis elevados de eficiência em suas ações históricas, apesar das limitações de seus horizontes ideológicos, tal como os representantes literários podem produzir expressões vigorosas e irrestritamente admiráveis, com essas mesmas limitações. Ele seria contrário a qualquer tentativa de desqualificação de célebres artistas por conta de marcas ideológicas deixadas em suas obras. E essas, ademais, se constituem em mediações histórias a serem captadas com vistas a apreender o real como totalidade.

Em relação à Economia Política ele também distinguiu os economistas clássicos, como Adam Smith e Ricardo, dos vulgares. A obra dos primeiros teria valor científico uma vez que procurava a conexão interna das relações de produção burguesa, sendo capazes, em alguma medida, de perceber a realidade por detrás da aparência, sem conseguirem ir além delas – apesar de demonstrarem contradições – definidas aos limites de suas visões de mundo definida pela condição de classe. Já os vulgares como Malthus, J. B. Say, Sênior, Bentham, dentre outros, não teriam feito mais do que dogmatizar e proclamar como verdades as concepções cotidianas a fim de manter a verdade obscura e, com isso, a sustentação das ideias da classe dominante.

É possível que estejam em análises como essas os gérmens do alargamento do conceito feito por Lênin, “como qualquer concepção da realidade social ou política, vinculada aos interesses de certas classes sociais”. (LOWY, 1993, p. 12) Daí se falar em luta ideológica, trabalho ideológico, na organização das classes. Tais ampliações, entretanto, não levaram ao abandono do sentido de ideologia como consciência invertida. É comum se utilizar a expressão “sentido forte” para qualificar ideologias desse tipo, e “sentido fraco”, quando se quer falar de visões de mundo de classes ou grupos sociais.

O autor há pouco referido nos fala também da tentativa do sociólogo Karl Mannheim, de distinguir ideologia e utopia. O primeiro termo deveria ser reservado para o conjunto de concepções, ideias e teorias que trabalham para a manutenção da ordem estabelecida, ou seja, de caráter conservador; enquanto o segundo termo abrangeria as concepções que visam construir outra realidade, com perspectiva, diríamos, revolucionária ou de negação da ordem existente.  

Ainda assim, a ênfase na ideologia como consciência invertida e como produção ligada diretamente aos interesses da classe dominante, como reflexo superestrutural da estrutura econômica, mantém-se com vigor teórico, muitas vezes identificado como uma marca positivista em certos “marxismos”, dentre os quais estaria a elaboração sobre os Aparelhos Ideológicos do Estado de Louis Althusser.

Cabe agora nos determos no pensamento de Antonio Gramsci (1991) que operou uma importante ampliação do tema da ideologia, vinculando-o à concepção de mundo de uma classe ou grupo social (conjunto de ideias, crenças, valores, pelos quais ele compreende o mundo) e, com isto, à cultura; e abrangendo o trabalho ideológico necessário à organização das classes, ao conceito de hegemonia.

Para o filósofo italiano, a concepção de mundo dos subalternos é, inicialmente, espontânea, desagregada, conformada pelas experiências de vida no âmbito de um grupo social ao qual pertence; desta forma, ela possui elementos compartilhados por esse grupo social, configurando o senso comum, que, compartilhado, compõe a cultura ou a ideologia que cimenta um grupo social.

O senso comum é composto por elementos que não correspondem à realidade (elementos, portanto, da consciência invertida); mas também por outros que dela se aproximam. Esses constituem o núcleo sadio do senso comum ou o bom senso e deve ser o ponto de partida para a elaboração crítica da concepção de mundo, visando a torná-la crítica, coerente e unitária. Trata-se de construir a consciência daquilo que somos realmente como sujeitos singulares e como sujeitos históricos.

Tornar nossa concepção de mundo crítica significa superar convicções que não correspondem à realidade e buscar aproximá-las ao máximo do real. É isto que se quer dizer com “elevá-la até o ponto atingido pelo pensamento mundial mais desenvolvido” [num determinado momento da história]. Este ponto, para Gramsci, é aquele atingido pelo conhecimento científico (sobre a natureza, e sobre as relações sociais) e esse é o que mais se aproxima da realidade “como ela é” porque é produto de uma interrogação sistemática e metodologicamente orientada. Torná-la coerente significa conquistar a coerência entre “pensamento” e “norma de conduta”, entre “teoria” e “prática”, entre “filosofia” e “prática”. Finalmente, torná-la unitária significa que essa concepção crítica e coerente não é de homens isolados, mas sim de um grupo/classe social e, portanto, capaz de orientar ações que envolvem e comprometem, conscientemente, todas as pessoas desse grupo. Na construção de uma concepção de mundo unitária, as pessoas são capazes de fazer a crítica de suas concepções individuais, superando-as por aquelas que dão unidade ao grupo: a cultura ou as ideologias orgânicas.

A este propósito, é bom salientar que Gramsci distingue entre dois tipos de ideologia, a saber: a) as elocubrações metafísicas inventadas por certos indivíduos, arbitrárias e ilusórias; b) as ideologias historicamente orgânicas que são necessárias a uma certa estrutura, ou seja, aquela que se manifesta implicitamente na arte, no direito, na atividade econômica, em todas as manifestações da vida individual e coletiva.

Mas, por mais coeso que seja um grupo social, não existe uma única concepção de mundo, e sim várias, que podem estar em confronto. Ocorre que uma delas tende a dar a direção das ações, tornando-se, então, a concepção de mundo hegemônica. Todo o movimento histórico configura-se como luta entre os grupos sociais pela conquista de hegemonia, uma forma pela qual se processa a luta de classes em sociedades do tipo “ocidental”, isto é, democrática e com a sociedade civil forte e organizada. Conquistar a hegemonia significa conquistar a “unidade” dos grupos sociais com base numa determinada concepção de mundo, o que é o mesmo que realizar a “unificação cultural”.

Na linha enunciada por Marx em O Dezoito Brumário, Gramsci reconhece e valoriza o fato de todo grupo social possuir seus intelectuais, que atuam para garantir a unidade filosófica – ou ideológica – deste grupo e lutar pela hegemonia. Esses intelectuais são aqueles que já superaram sua concepção de mundo desagregada por uma concepção crítica, coerente e unitária. Eles, chamados de orgânicos, diferem-se dos tradicionais por não exercerem o ofício de intelectuais, mas sim a prática política.

A organização cultural da classe subalterna conta com os intelectuais orgânicos e com os aparelhos privados de hegemonia. Privados não no sentido mercantil, mas por se organizarem na sociedade civil. Para o filósofo italiano, a igreja, a escola e o partido são aparelhos privados de hegemonia fundamentais de “unificação cultural” da classe. A diferença entre a igreja e o partido é que a primeira organiza a relação entre intelectuais e simplórios visando à manutenção dessa separação; enquanto no segundo, a separação é sempre provisória, posto que a função dos intelectuais é a de contribuir para a elevação de todos os simplórios à condição se serem também dirigentes.

A escola, por sua vez, é um espaço de contradição, pois nela se busca fazer a unificação com base na concepção de mundo do grupo social dominante/dirigente. Os educadores, entretanto, não se encontram todos identificados com essa mesma concepção de mundo, mas representam as diversas concepções de mundo existentes na sociedade. Não obstante, pelo fato de a escola – em todos os seus níveis – ser, ao lado a igreja, uma das maiores organizações culturais, Gramsci a vê como estratégica na unificação cultural dos trabalhadores. Unificação essa construída com base em outra concepção de mundo que não é a hegemônica (a classe dominante/dirigente detém a hegemonia). Para isso, os educadores devem assumir seu papel de intelectuais orgânicos da classe trabalhadora que, tendo se apropriado do conhecimento científico, contribuem, por meio desse, para a elaboração crítica da concepção de mundo pelos educandos, em coerência com aquela que possibilita sua emancipação e sua atuação também como dirigentes. Para exercer esse papel, o educador deve ser educado (deve também tornar sua concepção de mundo crítica, coerente e unitária com a classe à qual pertence). Para Gramsci o partido, por suas características, seria a organização em que o educador seria educado.

Contemporaneamente, a questão da ideologia precisaria ser debatida no âmbito de importantes transformações na sociabilidade capitalista. No plano cultural encontramos o “pós-moderno” como expressão de um tempo que não consegue definir relações sociais, políticas e culturais sem a ajuda de um prefixo de oposição ao anterior.

Nessa perspectiva, Fredric Jameson (1996) explica que o conceito de pós-modernidade tem a tarefa ideológica de coordenar as novas formas de práticas e de hábitos sociais mentais e as novas formas de organização e produção. As mudanças ocorridas no modo de produção capitalista estariam causando uma revolução cultural, quando a esfera autônoma da cultura é, de certa forma, dissolvida ou esmaecida. Diríamos que, mais do que em qualquer outro estágio do capitalismo, a pós-modernidade exacerba a inter-relação do cultural com o econômico ou, em outras palavras, o movimento cultural que se presencia é a produção de pessoas pós-modernas capazes de funcionar neste mundo socioeconômico. Por isso, a descrição infraestrutural da sociedade contemporânea embute sua descrição cultural, de forma que falar em superestrutura implica em expressar a “estrutura de sentimento” própria da atual organização econômica. Vimos que, Marx e Engels associaram ideologia à superestrutura.

Jameson (id., ibid.), neste caso, reporta-se a uma dimensão subjetiva, dada a exacerbação dessa esfera da sociabilidade humana promovida por esta “nova” cultura. O autor se vale da designação “capitalismo tardio” para se referir às manifestações da estrutura econômica no mundo contemporâneo, no qual está embutida a expressão cultural como seu índice temporal que chama a atenção para mudanças nas esferas do cotidiano e da cultura. Assim, dizer que os dois termos, o cultural e o econômico, se fundem um no outro e significam a mesma coisa, eclipsando a distinção ente base e superestrutura, é o mesmo que sugerir que a base, no terceiro estágio do capitalismo, gera sua superestrutura através de um novo tipo de dinâmica. Isto nos obrigaria a atuar nos fenômenos culturais no mínimo em termos da economia política.

Diz o autor que o argumento de que a cultura hoje não é mais dotada da autonomia relativa que teve em momentos anteriores do capitalismo não implica, necessariamente, afirmar o seu desaparecimento ou extinção. Ao contrário, a dissolução dessa autonomia deve ser vista como uma prodigiosa expansão da cultura por todo o domínio do social, até o ponto em que tudo em nossa vida social – do valor econômico e do poder do Estado às práticas e à própria estrutura da psique – pode ser considerado como cultural. Essa proposição, no entanto, é totalmente consistente com o diagnóstico de uma sociedade da imagem ou do simulacro, e da transformação do “real” em uma série de pseudo-eventos.

 Estamos de acordo com a conclusão de Jameson de que o pós-moderno não seria meramente uma ideologia cultural ou uma fantasia, mas é uma realidade genuinamente histórica (e socioeconômica), a terceira grande expansão original do capitalismo pelo mundo. Isto porque compreende, tal como já anunciara Marx e mais especificamente Gramsci, a dimensão ideológica está intrinsecamente incrustrada na realidade, que cimenta a estrutura e a superestrutura num bloco histórico.

 

Referências

BOTTOMORE, Tom. Ideologia. Dicionário do Pensamento Marxista. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1983, pp. 183-186.

ENDERLE, Rubens. Apresentação à Crítica da filosofia do direito de Hegel. São Paulo: Boitempo Editorial, 2005, pp. 11-26.

GRAMSCI, Antonio. Concepção dialética da história. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira: 1991

KONDER, Leandro. A questão da ideologia. São Paulo: Companhia das Letras, 2002.

LOWY, Michael. As Aventuras de Karl Marx contra o Barão de Münchhausen. São Paulo: Busca Vida, 1987.

________. Ideologias e Ciências Social. Elementos para uma análise marxista. São Paulo: Cortez Editora, 1993,

JAMESON, Fredric. Pós-modernismo. A lógica cultural do capitalismo tardio. São Paul: Ática, 1996.

MARX, Karl. Crítica da filosofia do direito de Hegel. São Paulo: Boitempo Editorial, 2005.

________. Contribuição à crítica da Economia Política. São Paulo: Martins Fontes, 2003.

MARX, Karl e ENGELS, Friedrich. A Ideologia Alemã. São Paulo: Hucitec, 1991.

PETITFILS, Jean-Christian. Charles Fourier. In: Os Socialistas Utópicos. São Paulo: Círculo do Livro, 1977, pp. 89-112.

 


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